Tem crescido na internet em geral, mas principalmente na esquerda durante os últimos meses, um discurso de oposição à pornografia em si.
Meu artigo não tem por objetivo reduzir em nenhum nível os inúmeros problemas da indústria da pornografia e do trabalho sexual em geral, que dentro do capitalismo são de fato terríveis. Minha intenção aqui é apontar meramente o porquê o movimento pela negação e proibição da pornografia não somente não pode solucionar estes problemas, como não tem a intenção de fazê-lo.
Algumas pessoas que tem tomado este posicionamento são abertas quanto à sua intenção de proibir a pornografia, outras se acovardam e tentam esconder a única implicação lógica do que dizem, mas qual é a causa da ascensão dessa retórica? Ela faz sentido?
Nos últimos anos a retórica anti-pornografia tem ascendido no meio incel e em movimentos misóginos similares. É “curioso” que ditos socialistas estejam em coro com este pessoal, mas os problemas com isso vão bem mais em baixo.
Os opositores da pornografia nunca vão te contar sobre a ligação tanto histórica quanto atual da narrativa deles com o racismo: um dos grandes motivos de oposição da pornografia era, e ainda é, que ela incentiva supostamente a miscigenação racial — como se isso fosse algum tipo de problema mesmo se fosse verdade. Da mesma forma eles tem muito cuidado para que você não descubra o caráter de teoria da conspiração desta mesma narrativa; se você perguntasse quem está financiando a indústria da pornografia, quando metade do movimento antipornografia gritar “os judeus!”, o povo despertaria para as intenções perversas nas raízes do movimento de oposição à pornografia.
Falando em intenções perversas, os aderentes deste mesmo movimento gostam de fingir que tem como principal motivo o feminismo. Uma mentira óbvia.
Primeiro de tudo, se fosse o caso porque estão ativamente tanto repetindo a mesma narrativa, quanto se aliando a grupos de direita abertamente opostos a esta mesma causa?
Segundo lugar, é um fato conhecido que a “ala de esquerda” (que, na verdade, não o é) do movimento anti-pornografia é infestado e encabeçado por TERFs. Sendo este o caso, é até engraçado tentar roubar o feminismo e tentar usá-lo como escudo para esta finalidade.
O exclusivismo anti-pornográfico não se dá apenas no TERFismo aberto. Os adeptos do movimento são, como é de se imaginar, exclusivistas de trabalhadores do sexo em geral, e como parte desta corja fazem muita questão de sempre se referir à categoria inteira no feminino, uma tentativa de apagar trabalhadores sexuais com identidades masculinas e não-bináries.
Falando em como lidar com trabalhadores sexuais, o movimento anti-pornografia não tem nem uma única proposta concreta de como ajudar-lus. Isto porque esta não é sua intenção.
O movimento anti-pornografia por padrão aponta como única “solução” a proibição legal, ou seja: a ideia deste movimento para ajudar trabalhadores sexuais a prender-lus e mata-lus. Os adeptos da anti-pornografia vão dizer que nunca seriam favoráveis à repressão desta categoria, mas quem não é ignorante a respeito de como leis acontecem na prática sabe como a coisa realmente aconteceria fora do papel, e devemos julgar este movimento pelo que realmente quer, não pelas intenções que afirmam ter no coração.
Os setores mais “avançados” do movimento anti-pornografia tem a proposta resolver o problema “convertendo” trabalhadores sexuais para sua visão conservadora e retrógrada de “socialismo”. Vejam só, em primeiro lugar eles julgam ils trabalhadores sexuais como ignorantes e incapazes de ter as próprias conclusões, depois eles planejam tirar-lhe a autonomia e transformar toda a categoria em cópias de si. Tão “benevolentes”!
Falando em conservadorismo, as implicações práticas da anti-pornografia são tão anti-LGBTQIA+ quanto qualquer teocracia existente na atualidade. Nós sabemos que segundo o olhar cisheteronormativo um mero beijo entre duas pessoas LGBTQIA+ é o mesmo que pornografia pesada. Levando em conta que o movimento anti-pornografia não tem a menor intenção de lutar contra a cisheteronormatividade, o único resultado prático possível da proibição da pornografia é a proibição da representação LGBTQIA+.
Comentando uma última característica deste movimento em si: os adeptos da antipornografia podem chorar e bater o pé enquanto quiserem, mas a verdade continuará sendo que a crença deles é pseudocientífica. O “vício em pornografia” não é levado a sério no meio científico, ele não é reconhecido. Nenhuma quantidade de podcasts feitos com figuras da direita vai mudar isso.
No fim, o movimento anti-pornografia está destinado ao fracasso. Está destinado ao fracasso devido ao capitalismo e suas contradições, que criam movimentos reacionários como o movimento anti-pornografia, e o qual também precisa da pornografia para lucrar. Em fim, a ideia da anti-pornografia é facilmente derrubada por qualquer setor sério da esquerda.
A Classe Vencerá.